quarta-feira, 18 de maio de 2011

madrid

cheguei ontem de madrid. doente curiosamente. talvez tenha finalmente desenvolvido uma espécie de condicção patológica que se fará doravante sentir sempre que tiver de abandonar um país e regressar a este lamaçal. é tão possível como compreensível.

bom, talvez seja relativamente pública a repulsa que tenho pela língua espanhola e pelos espanhóis em si, mas ainda assim, tenho de admitir que, como aliás já esperava, levamos goleada deles também. digo-o aqui sem qualquer problema, é possível ter uma vida em madrid. não quero com isto dizer que madrid é a melhor cidade do mundo, ou que sonho lá voltar. nada disso. quiça, até pisei solo madrileno pela primeira e última vez. o que quero dizer é que madrid é uma cidade que faz sentido. e é tão simples uma pessoa aperceber-se de tal facto como fazer uma viagem no metro. vê-se gente. na sua vida. gente de ambos os sexos. com bom aspecto. ou não. a beber. ou quase completamente adormecida. é uma diversidade que faz bem à alma. e que se extende às ruas e parques da cidade. seja de noite ou de dia, há sempre gente na rua, não terão a chance de ouvir um cão, lá longe, a ladrar. mas sobretudo, não terão de olhar de frente para uma realidade obscenamente masculina. não. porque mesmo de noite, vêem-se vários grupos de raparigas. desmarcadas. true story. acreditem se quiserem. e mais, sei que já estou a esticar a corda, mas posso-vos dizer que cheguei a entrar e ver bares com mais mulheres que homens. impensável? sim, em portugal.

a própria cidade é por si só engraçada. não será a coisa mais bonita do mundo, mas não posso dizer que não vale a pena deitar-lhe uma vista de olhos. há muito que ver. e grátis, como qualquer tuga que se preze gosta.

quanto à noite, têm um sem fim de bares e discos por onde escolher. fica desde já o aviso no entanto, a partir das 3-4 da manhã, as discos transformam-se numa selva autêntica, pois nessa altura há já muito mais homens que mulheres e andam todos desesperados a ver se caçam alguma coisa. nada que não acontecesse aqui também se houvesse mulheres nas discos a essas horas tardias... como não as há, entretêm-se os guerreiros a abrir a cabeça uns aos outros. portanto, como podem ver, até na miséria somos mais miseráveis, essa é a verdade. e eu posso falar porque estive em 3 discos diferentes, na joy, no pacha e na kapital, e em todas foi a mesma coisa... por volta da 1 da manhã as coisas estavam bastante aceitáveis, como em portugal nunca se há-de ver. mas claro, à medida que a noite foi avançando... o canavial foi crescendo. normal. afinal de contas, ainda estamos a falar de espanha. e ainda assim, houve quem tenha vindo ter comigo, sem ser para cravar fosse o que fosse. mais uma coisa impensável em portugal.

bom, em abono da verdade, tenho de dizer que se bem que de certa forma até achei engraçado, as discos de madrid não me deixam grandes saudades. fica caro (com entradas na ordem dos 20-30 euros, e as bebidas a 12 euros) e acaba por não compensar. vale mais, muito sinceramente, saír pa rua, pa bares ou tascas. e é aqui, neste ponto, que madrid me deixou uma impressão positiva. não é melhor que a polónia, não é melhor que o brasil, não é melhor que a rsa, mas sabem que mais? é muito, muito, mas muito melhor que portugal. seja no metro, nas ruas, numa qualquer praça, num jardim, num parque, num museu, num café, numa esplanada... é na verdade possível acabarem por conhecer alguém que valha a pena. há uma vida para viver e aquele sentimento de que tudo é vão, e que o fim não depende de nós mas está somente à nossa espera, fica no aeroporto, à espera que regressemos.

dou-vos um exemplo. no sábado, estava à espera do metro para ir pa kapital e do outro lado da linha, à espera também para seguir no sentido contrário, estava um panasca (no verdadeiro sentido da palavra) e 2 raparigas. na altura havia pouca gente na plataforma e eu lembro-me de ter reparado que uma das raparigas, apesar de pequenita, não tinha grandes defeitos. faltavam uns minutos para o metro chegar, o que certamente explica porque é que, pelo menos no meu caso, sem querer, cruzei olhares com ela. e bem, tal como eu me apercebi, também ela se apercebeu, até porque nesse momento, sorriu e continuou a olhar directamente para mim, até que eventualmente eu desviei o olhar. e assim foi até que o metro acabou por chegar. entrei, olhei pela janela, e a rapariga olhou pa mim também, e naquele momento, passei a compreender melhor as amarguras de vida do james blunt.

e toda esta mariquice para quê? para vos dizer que esta ausência de propósito maior que nos vai preenchendo os dias, esta rotina vã que acaba com qualquer boa vontade... são uma fatalidade nossa e só nossa, mas uma fatalidade que não tem como extrapolar as fronteiras deste lamaçal rectangular. essa é a parte boa.